segunda-feira, 29 de abril de 2013

SAUDADE



No final de semana quando conversava com meu marido sobre vários assuntos ele falou sobre seu irmão Samuel, que morreu em novembro de 2012. Ele contou que deixa o relógio que era de Samuel sempre a vista, ele não coloca no braço, mas faz questão de deixá-lo sempre perto para poder dar cordas, pra poder tocar nele, é uma forma que ele encontra de compensar a saudade que sente do irmão. Isso me fez lembrar que saudade é uma das palavras mais presentes na poesia de amor da língua portuguesa e também na música popular. "Saudade", só conhecida em galego e português, descreve a mistura dos sentimentos de perda, falta, distância e amor. A palavra vem do latim "solitas, solitatis" (solidão), na forma arcaica de "soedade, soidade e suidade" e sob influência de "saúde" e "saudar". Diz a lenda que o termo foi cunhado na época dos Descobrimentos portugueses e do Brasil colônia, quando esteve muito presente para definir a solidão dos portugueses numa terra estranha, longe de entes queridos. Define, pois, a melancolia causada pela lembrança; a mágoa que se sente pela ausência ou desaparecimento de pessoas, coisas, estados ou ações. Uma visão mais especifista aponta que o termo saudade advém de solitude e saudar, onde quem sofre é o que fica à esperar o retorno de quem partiu, e não o indivíduo que se foi, o qual nutriria nostalgia. A gênese do vocábulo está diretamente ligada à tradição marítima lusitana. Nada aplacará a saudade causada pela morte, não há como remediar a dor da saudade causada pela morte daqueles a quem amamos. Por isso é tão importante mantermos relações de proximidade com nossos queridos, para que ao sermos assolados pela morte novamente, possamos ter o consolo das mais ricas lembranças a nos confortar nos dias de saudade. Não deixemos que frivolidades impeçam que tenhamos momentos de comunhão com nossas famílias, com nossos amigos e com aqueles mais chegados que irmãos. “ Oh quão bom e com suave é que os irmãos vivam em união”. A saudade estampada no rosto do meu marido muito me comoveu, e me fez pensar que grande significado tem aquele relógio, porque ele me fez lembrar que o tempo é curto e deve ser bem aproveitado, nunca desperdiçado, que  daremos contas a D’us pelo que fizemos de mal e de bem também. Por isso quis compartilhar esse sentimento com vocês. Quanto tempo você gastou hoje e como gastou?
D’us nos abençoe.
Rosana Márcia.

domingo, 21 de abril de 2013

70 x 7 ?



Hoje, uma manhã chuvosa e fria (coisa rara aqui no RJ), me encontro a pensar sobre vários assuntos. Mas minha mente se agarra, tal qual um chiclete na sola de um  sapato, uma questão, e que quero compartilhar com vocês. Minha questão é a seguinte, por que somos tão impelidos a odiar e tão demovidos a perdoar? Por que ficamos encontrando “desculpas” para justificar o rancor que alimentamos. Será que não percebemos que em longo prazo deixar de perdoar a quem nos fez mal só fará mal a nós mesmos, tornando-nos pessoas incapazes de amar, cheias de doenças psicossomáticas e amargas? Meu marido me ensinou muitas coisas (mesmo ele sofrendo de ingenuidade patológica), entre elas,  duas  quero destacar – aprendi a ter misericórdia e a perdoar. Não sofri pouco nessa vida, e pude experimentar o sofrimento já na tenra idade. Hoje não vou dizer que perdoar é um exercício fácil para mim, mas por ser um exercício ele fortalece o meu caráter dando-me forças para seguir em frente. Dizem os especialistas que o exercício físico libera no cérebro substâncias que proporcionam uma sensação de paz e de tranquilidade. São as endorfinas, neuromediadores ligados a génese do bem-estar e do prazer. Por ser um potente libertador de endorfina o exercício físico cria a boa dependência quando praticado regularmente e faz falta como faria qualquer outra substância associada ao prazer. Quero traçar um paralelo do exercício físico ao exercício do perdão, enquanto o exercício físico libera endorfina criando dependência e nos faz falta se não praticarmos regularmente, assim o exercício do perdão libera a conexão com D’us, criando uma dependência do Pai, gerando uma sensação de bem-estar e prazer, concedendo paz, tranquilidade e aprovação de D’us. Recentemente uma amiga – querida demais – postou uma frase em uma rede social que dizia o seguinte: “Somente aquilo que realmente somos pode nos curar” (Jung). Isso ficou na minha cabeça, porque sempre questiono o que leio, e sempre tento aproveitar alguma lição para mim. Comecei a pensar sobre o que sou realmente? E conclui que as minhas ações são resultado do que sou, mas se não me enfrento, as minhas ações serão danosas para mim e para o outro. Mas se me reconheço, posso compreender que o que sou realmente evitando ações que magoem o outro, alimentando assim o mal que há em mim. Somos o resultado de tudo o que foi impresso em nós, por isso o resultado nem sempre será bom, muito pelo contrário, na maioria das vezes será ruim. Mas existe alguém que pode  ajudar a nos enfrentarmos, libertando-nos de nós mesmos. Se você sabe o que realmente és, e isso faz de você um mal para o outro, “volta pra D’us, que Ele te quer, volta ao teu porto, pois só há lugar feliz onde se é amado, e como Ele te ama”! Se, pois, o filho vos libertar verdadeiramente sereis livres (João 8:36). E livres, não haverá obstáculos para o perdão.
D’us nos abençoe!

Rosana Márcia

domingo, 14 de abril de 2013

SINDROME DE JONAS



Ando pensando sobre os últimos acontecimentos, sobre pastores desonestos, sobre direitos humanos e sobre o homossexualismo. Tenho percebido como as pessoas demonstram o que pensam nas redes sociais, e como elas revelam quem realmente são nos seus “post’s”. Eu mesma faço isso muitas vezes, no sentido de defender o que penso e mostrar a todos no que eu creio. Recentemente decidi parar de me envolver na “guerra de compartilhamentos” pró-Feliciano e pró- Jean Willys pensei que não devo colocar nenhum dos dois em mais evidencia ainda, porque acabamos enaltecendo os personagens de uma história onde os dois estão errados. Então comecei a apresentar o que eu chamarei de a Síndrome de Jonas. Nenhum outro livro do Antigo Testamento (Bíblia Sagrada) busca de maneira tão enfática a extensão da misericórdia divina às nações gentias. Em Jonas, a misericórdia divina é oferecida aos pagãos, que se arrependem e reagem favoravelmente ao Deus de Israel.
Foi assim que tudo começou
Um dia Jonas estava em casa, aí pelo ano 750 aC, quando Deus falou com ele.
“Veio a palavra do Senhor a Jonas, filho de Amitai, dizendo: ‘Dispõe-te, vai à grande cidade de Nínive, e clama contra ela porque a sua malícia subiu até mim”.
Sem dúvida, esta era uma tarefa para a qual Jonas não tinha absolutamente o coração disposto. Jonas se dispõe, sim, mas para fugir da presença do Senhor e encafurnar-se em Társis. O texto é irônico. Deus disse: “Dispõe-te”. Jonas de fato se dispôs, mas para fugir da presença do Senhor. Se acontecesse no norte do Brasil, eu diria que as pessoas falariam da seguinte maneira: “É, Senhor Deus, estou muito disposto, mas a fugir dessa obrigação”.Para Jonas aquela era uma missão que confrontava profundamente seu nacionalismo e sua consciência ideológica. Ele prefere fugir a ela, deixando assim de sacrificar sua coerência político-ideológica. “Tendo descido a Jope, achou um navio que ia para Társis. Pagou, pois sua passagem, e embarcou nele, para ir com eles para Társis, longe da presença do Senhor”.  Jonas fugiu! “Mas o Senhor lançou sobre o mar um forte vento, e fez-se no mar uma grande tempestade, e o navio estava a ponto de se despedaçar”. De repente os até então bem sucedidos planos de Jonas são confrontados pelo pior de todos os oponentes: o amor apaixonado de Deus. Isso porque nenhuma fuga de Deus dura para sempre, quando aquele que foge é alguém que o conhece. É melhor viver como um ateu alienado de Deus do que como um cristão fugindo de Deus. As consequências práticas do ateísmo e do paganismo são menos dramáticas do que aquelas que atingem a vida dos que estão num processo de fuga de Deus. A existência se torna inimiga dos servos de Deus em desobediência. Não há ninguém mais sujeito ao azar na vida do que um servo de Deus consciente da sua vontade e em processo de fuga de Deus. “Então os marinheiros, cheios de medo, clamavam cada um ao seu deus, e lançavam ao mar a carga que estava no navio para o aliviarem do peso dela”.Jonas tenta fugir de Deus e cai dentro de uma fervorosa reunião de oração. Talvez em navio nenhum do mundo se tenha orado tanto quanto naquele navio em que se encontrava Jonas. Ele descobre fé entre os pagãos “como nem em Israel”. Já ouviu isso antes? “Nem em Israel achei fé como esta”! Na tentativa de fugir de Deus, tudo fala mais de Deus do que na tentativa de obedecer-lhe. Todavia, o ouvir de Deus em desobediência é um ouvir apavorado. Os marinheiros estão em pânico. Preces de desespero são erguidas aos céus. “Jonas, porém, havia descido ao porão e se deitado; e dormia profundamente”. No texto da versão grega do Velho Testamento, chamada de Septuaginta, se diz que Jonas não só dormia, mas “roncava profundamente”. Ele foi capaz de abandonar a mais fervorosa reunião de oração da sua vida e afundar-se em lânguido sono. Isso porque a desobediência à vontade de Deus elimina sempre a vontade de viver. Quem acha a vida, perde-a. Quem a perde, acha-a. Quem conhecendo a Deus não lhe faz a vontade acaba perdendo a vontade de viver. Esta é, sem dúvida, uma lei existencial realmente irônica: enquanto os pagãos ansiavam por viver e lutavam com raça e garra por sua vida, Jonas se auto-sepultara num sono de desistência da vida. “Chegou-se a ele o mestre do navio e lhe disse: Que se passa contigo? Agarrado no sono? Levanta-te, invoca o teu Deus; talvez assim esse Deus se lembre de nós para que não pereçamos”. O estado de alienação da vontade de Deus torna Jonas menos humano e menos cristão do que os pagãos. Eles lutavam pela vida; Jonas dormia. Eles invocavam cada qual o seu deus; Jonas não tinha prece em seus lábios, estava totalmente silencioso. Ele é o típico líder cristão, pastor, teólogo, profeta, ou líder natural na comunidade que desaprendeu a possibilidade da oração, cerrou os lábios, ficou mudo, sem preces. Os pagãos do navio eram mais sensíveis aos sinais dos tempos do que o cristão Jonas. Eles não interpretavam a tempestade como um mero fenômeno natural; sabiam por intuição que havia algo alienígena naquela tempestade. Por isso, diziam uns aos outros: “Vinde, e lancemos sortes, para que saibamos por causa de quem nos sobreveio este mal. E lançaram sortes, e a sorte caiu sobre Jonas”. Jonas perdera totalmente a consciência de que o mundo espiritual também funciona à base da lei de causa e efeito. No entanto os marinheiros pagãos pareciam saber com muita clareza que ninguém foge de Deus impunemente. A sorte é lançada, e o azar é de Jonas. Descobre-se que o homem de Deus era a causa da desgraça. Sua vida atraíra maldição sobre todo o grupo. Preste atenção nisto: homens de Deus em fuga de Deus trazem maldição aonde quer que vão. Também uma igreja alheia à vontade de Deus é instrumento de desgraça para a sociedade. Esta é a lição que os marinheiros nos dão quando dizem a Jonas: “Declara-nos agora por causa de quem nos sobreveio este mal. Que ocupação é a tua? Donde vens? Qual a tua terra? E de que povo és tu? Ele lhes respondeu: Sou hebreu, e temo ao Senhor, o Deus do céu, que fez o mar e a terra”. Jonas responde apenas à última pergunta. Sua resposta é evasiva, com traços de autojustificação além de definidora de uma atitude existencial de cinismo teológico. Quando diz “Sou hebreu” ele parece estar tentando dizer a si mesmo que tinha direito a peregrinação, ou talvez àquela peregrinação. Afinal, a palavra hebreu provém dum radical que significa “aquele que passa, aquele que vai, aquele que se move, aquele que está a caminho, aquele que anda”. É assim que Jonas se justifica: “Eu estou fugindo porque existencialmente sou um ser a caminho”. E quando ele afirma que “teme ao Senhor, o Deus do céu, que fez o mar e a terra” ele nos apresenta seu cinismo existencial e teológico. Ele confessa temer um Deus cósmico do qual pensa ser possível fugir. Confessa temer ao Senhor, mas não lhe dirige uma prece sequer. Ele é como muitos que têm uma teologia para justificar suas fugas de Deus e uma fé que não produz oração. Nada é mais falso que uma teologia que não leve a orar – por mais ortodoxa que seja, como era o caso da de Jonas. A declaração sobre quem é o Deus de Jonas, e as razões da viagem apresentadas por Jonas apavoraram os marinheiros. Possuídos de grande temor, inquiriram:“Que é isto que fizeste? Pois sabiam os homens que fugia da presença do Senhor, porque lho havia declarado”. Neste ponto a Bíblia começa a condenar a tragédia de se ter uma intimidade com Deus tornada cínica. Jonas estava literalmente brincando com fogo, e não sabia. Ou sabia, mas se negava a considerar as conseqüências. E mais: a Palavra de Deus mais uma vez nos ensina que são justamente os pagãos que revelam ter uma fé em Deus mais profunda do que Jonas. Isso porque temem suas divindades com mais reverência e dedicação do que muitos a Deus, entre os que se declaram povo de Deus. Os marinheiros parecem estar argüindo: “Jonas, quem tem um Deus como o seu tem todas as opções da vida, menos a de fugir de Deus”. E mais que isso: eles sabem que algo tem que ser feito a fim de que a calamidade seja contida. Por isso lhe perguntam: “Que te faremos, para que o mar se nos acalme?” “Porque o mar se ia tornando cada vez mais tempestuoso”. Jonas responde: “Tomai-me, lançai-me ao mar, e o mar se aquietará; porque eu sei que por minha causa vos sobreveio esta grande tempestade”. Desta forma Jonas assume o fato de que a tragédia que se tornara de todos naquela pequena sociedade da embarcação era conseqüência direta da sua fuga de Deus. Ele tinha plena consciência disso. Tanto era assim que afirmou: “Eu sei que sou a razão da tragédia”. Neste ponto ele parece estar ainda com uma significativa vantagem sobre nós, os que estamos lendo este artigo. Isto porque para muitos de nós, diferentemente de Jonas, a tragédia do mundo parece nada ter a ver conosco. Todavia tem tudo a ver. E a razão é simples: aqueles que são designados a ser bênção para o mundo tornam-se maldição para a sociedade, quando não assumem seu papel de bênção na vida. Contudo os homens remavam, esforçando-se galhardamente por atingir a terra, sem no entanto nada conseguir, porque o mar se tornara cada vez mais tempestuoso, investindo contra a embarcação. Então clamaram ao Senhor, dizendo: “Ah, Senhor, rogamo-te que não pereçamos por causa da vida deste homem, e não faças cair sobre nós este sangue, quanto a nós, inocente; porque tu, Senhor, fizeste como te aprouve. E levantaram a Jonas, e o lançaram ao mar; e cessou o mar da sua fúria. Temeram pois estes homens em extremo ao Senhor, e ofereceram sacrifícios ao Senhor, e fizeram votos”. Esta é uma das muitas ironias da história de Jonas. Na intenção de fugir de Deus e da sua missão ele acaba sendo instrumento de salvação para muitos povos. Aqui fica uma tremenda lição: o mundo só tem o verdadeiro testemunho da salvação quando a Igreja dá este testemunho com pureza e verdade, ou quando confessa sua fuga e sua desobediência à vontade de Deus. Jonas confessa a verdade, ainda que em meio a uma profunda falta de ânimo espiritual. Ele dá testemunho de sua fuga de Deus, do Deus a quem não se foge, o Deus de toda a vida, e que está em toda parte. O princípio espiritual implícito neste evento é simplesmente tremendo: quando o povo de Deus tem coragem de confessar que a culpa é sua, o mundo crê. Neste ponto da narrativa da história de Jonas parece que atingimos o ápice de sua desgraça e desesperança. Sua vida e seu ministério parecem definitivamente liquidados. Mas é neste ponto que nos é lembrado que “o dom e a vocação de Deus são irrevogáveis”. “Deparou o Senhor um grande peixe, para que tragasse a Jonas; e esteve Jonas três dias e três noites no ventre do peixe. Então Jonas do ventre do peixe orou ao Senhor, seu Deus e disse: ‘Na minha angústia clamei ao Senhor, e ele me respondeu; do ventre do abismo gritei, e tu me ouviste a voz”.Deus não desiste de Jonas – embora o que parecia era que Jonas desistira de Deus completamente. Todavia ele dá a impressão de ser o exemplo clássico da pessoa que só ora em dificuldade extrema. Se não, observe: ele não orou para decidir (Jn, 1:3); não orou quando a tempestade veio (Jn, 1:4); não orou quando todos oravam (Jn, 1:5); não orou quando a verdade sobre sua fuga se tornou pública (Jn, 1:10,11); não orou quando os marinheiros, num último rasgo de solidariedade humana, tentavam chegar à terra remando (Jn, 1:13); não orou quando os marinheiros oravam pedindo a Deus que não os culpasse por terem que lançá-lo ao mar (Jn, 1:14); e provavelmente não orou nem no primeiro nem no segundo dia no ventre da baleia, o grande peixe, o monstro marinho, porque se tivesse orado antes talvez a história não houvesse contado que ele permaneceu no ventre três dias e três noites. O profeta Jonas parece ter sido realmente renitente: deixou para orar no último dia. É no entanto no ventre do peixe que ele começa a recuperar sua saúde humana e sua fé. É no ventre do peixe que começa a recuperar a saúde da alma, quando restaura uma das mais fantásticas possibilidades da alma humana, a possibilidade da angústia. Quando diz: “Na minha angústia clamei ao Senhor”. Angústia aqui aparece como um sintoma de que a alma está viva. Pois até então sua apatia só falava de uma alma sem nervos, morta. “Pois me lançaste no profundo, no coração dos mares, e a corrente das águas me cercou, todas as tuas ondas e as tuas vagas passaram por cima de mim. Então disse: ‘Lançado estou de diante dos teus olhos; tornarei porventura a ver o teu santo templo?” Com toda a sua teologia, Jonas ainda pensava ser possível, na prática, fugir de Deus. Isso porque orava suplicando livramento, sem contudo entender que a própria tragédia de ter sido engolido pelo monstro era parte da resposta que buscava em Deus. Jonas não entendia tragédia como possibilidade de expressão do amor de Deus. “As águas me cercaram até à alma, o abismo me rodeou, e as algas se enrolaram na minha cabeça até os fundamentos dos montes. Desci até a terra, cujos ferrolhos se correram sobre mim para sempre; contudo fizeste subir da sepultura a minha vida, ó Senhor, meu Deus!” No auge de um quase sadio desespero Jonas experimenta a realidade existencial da ressurreição: é arrancado da sepultura. Ele tinha que morrer para poder provar o poder existencial da ressurreição: “Quando dentro em mim desfalecia a minha alma, eu me lembrei do Senhor; e subiu a ti a minha oração”. Oração é a única e suficiente resposta da alma em crise ao Deus que busca restaurá-la. Oração é o sinal por excelência de que a alma ainda está viva: “Os que se entregam à idolatria vã abandonam aquele que é misericordioso”, diz Jonas. Neste ponto Jonas assume sua própria idolatria. Isso porque no contexto do livro o único verdadeiramente idólatra é ele. Ele foi aquele que cultuou de forma tão absoluta a ideologia e o nacionalismo que preferiu fugir de Deus a ter que trair seus compromissos políticos e ideológicos. Agora ele diz: “Mas com a voz do agradecimento eu te oferecerei sacrifício; o que votei, pagarei. Ao Senhor pertence a salvação”. Jonas resolve que se houvesse uma outra chance ela não seria desperdiçada. Uma vez livre da tragédia de estar preso no porão dos oceanos, ele se compromete a cumprir a missão da qual fugira. Rende-se pois à implacável perseguição do amor de Deus, na sua obstinada insistência de não perder um profeta, de não perder um líder. “Falou pois o Senhor ao peixe, e este vomitou a Jonas na terra. Veio a palavra do Senhor segunda vez a Jonas, dizendo: ‘Dispõe-te, vai à grande cidade de Nínive, e proclama contra ela a mensagem que te digo’. Levantou-se pois Jonas, e foi a Nínive, segundo a palavra do Senhor. Ora, Nínive era cidade importante diante de Deus, e de três dias para percorrê-la. Começou Jonas a percorrer a cidade, caminho de um dia, e pregava e dizia: ‘Ainda quarenta dias, e Nínive será subvertida’. Os ninivitas creram em Deus; e proclamaram um jejum, e vestiram-se de panos de saco, desde o maior até o menor. Chegou esta notícia ao rei de Nínive; ele levantou-se do seu trono, tirou de si as vestes reais, cobriu-se de pano de saco, e assentou-se sobre cinza. E fez-se proclamar e divulgar em Nínive: Por mandado do rei e seus grandes, nem homens, nem animais, nem bois, nem ovelhas provem coisa alguma, nem os levem ao pasto, nem bebam água; mas sejam cobertos de pano de saco, assim os homens como os animais, e clamarão fortemente a Deus e se converterão cada um do seu mau caminho, e da violência que há nas suas mãos. Quem sabe se voltará Deus e se arrependerá e se apartará do furor da sua ira, de sorte que não pereçamos? Viu Deus o que fizeram, como se converteram do seu mau caminho: e Deus se arrependeu do mal que tinha dito lhes faria, e não o fez. Com isso desgostou-se Jonas extremamente, e ficou irado”. Jonas não estava interessado em nenhuma conversão ou arrependimento que não tivesse implicações de mudança imediata na cena política à sua volta. Se fosse hoje ele diria: “O novo nascimento que não mudar a atitude política das pessoas não tem nenhum valor histórico”. Então Jonas orou ao Senhor e disse: “Ah! Senhor, não foi isso o que eu disse, estando ainda na minha terra? Por isso me adiantei, fugindo para Társis, pois sabia que és Deus clemente e misericordioso, tardio em irar-se e grande em benignidade, e que te arrependes do mal”. O que ele queria não era vê-los salvos, mas achatados, esmagados. Assim ele diz: “Peço-te pois, ó Senhor, tira-me a vida, porque melhor me é morrer do que viver”. É em razão disso que o Senhor o questiona: “É razoável essa tua ira? Então Jonas saiu da cidade, e assentou-se ao oriente da mesma...” Ora, é importante lembrar que na tradição bíblica é do Oriente que sempre vem o juízo e o castigo. “Assentou-se ao oriente da mesma, e ali fez uma enramada, e repousou debaixo dela, à sobra, até ver o que aconteceria à cidade.” Jonas tem ainda uma última esperança: de que a cidade se arrependa de ter se arrependido e volte a pecar, atraindo assim o juízo de Deus contra si.  “Então fez o Senhor Deus nascer uma planta, que subiu por cima de Jonas para que fizesse sombra sobre a sua cabeça, a fim de o livrar do seu desconforto. Jonas, pois, se alegrou em extremo por causa da planta. Mas Deus no dia seguinte, ao subir da alva, enviou um verme, o qual feriu a planta, e esta se secou. Em nascendo o sol, Deus mandou um vento calmoso oriental; o sol bateu na cabeça de Jonas, de maneira que desfalecia, pelo que pediu para si a morte dizendo: Melhor me é morrer do que viver. Então perguntou Deus a Jonas: É razoável essa tua ira por causa da planta? Ele respondeu: É razoável a minha ira até a morte. Tornou o Senhor: Tens compaixão da planta que te não custou trabalho, a qual não fizeste crescer; que numa noite nasceu e numa noite pereceu; e não hei eu de ter compaixão da grande cidade de Nínive em que há mais de cento e vinte mil pessoas, que não sabem discernir entre a mão direita e a mão esquerda, e também muitos animais?” E Deus termina dizendo: “Jonas, por favor! redimensione o que você sentiu pela planta e você será capaz de sentir o que eu sinto por Nínive. O apelo final de Deus a Jonas é no sentido de que ele recupere a possibilidade da compaixão e da misericórdia. Em outras palavras, Deus está dizendo que a única forma de se viver qualquer projeto em nome dele na história é colocando a causa da salvação acima de tudo, inclusive acima daquelas causas às quais muitas vezes são atribuídos interesses prioritários relacionados ao seu reino. Além do mais, não há nenhuma saúde possível para o homem de Deus que não tem dentro de si a possibilidade do amor compassivo. Sem esse amor compassivo a vida mergulha na amargura, no justicismo perverso, na unilateralidade ideológica e num viver que perde a possibilidade do amor e da compaixão, cujo único fim e propósito é alimentar na alma a amargura de não conseguir amar aquelas criaturas estranhas em volta de nós, tão amadas por ele. Portanto, meu irmão e minha irmã, o apelo de Deus a todos nós é este: “Volte a amar tudo e todos quantos eu amo, mesmo os mais inamáveis da história. Caso contrário, sua vida será marcada pela tragédia de um amargor sem cura”.
O que eu chamo de Sindrome de Jonas, é o que eu estava sentindo nos últimos dias, quando decidi que não queria mais saber dessa disputa de forças do pastor e os homossexuais, simplesmente agi como Jonas – que Deus castigue todos eles que vivem em dissonância com a sua vontade, é o que eles merecem! Esqueci-me totalmente da imensa misericórdia de Deus, e o desejo dEle que o pecador se arrependa. Por isso, devo abandonar a síndrome de Jonas, me posicionar contra o pecado, e não me calar, mas pregar a verdade ao pecador, que Deus deseja que ele abandone seus maus caminhos e converta-se ao Senhor!


Rosana Márcia.


Fonte: Jonas o sucesso do fracasso – Caio Fábio